sábado, 18 de dezembro de 2010

Da infância redescoberta na profissão

Da introdução da dissertação de mestrado de Marcelo Hashimoto defendida no IME-USP em 2007 -- que todas as pessoas pudessem ter tanta poesia no que escrevem:
"Imaginemos uma criança. Crianças nada mais são do que indivíduos que estão vivos há pouco tempo. Para compreender o significado de pouco nessa definição, o leitor deve se desvencilhar da frieza dos números e pensar principalmente em insuficiência; em pessoas cuja ingenuidade ainda não foi suficientemente maculada pela experiência; em criaturas cujo entusiasmo ainda pode ser despertado pelo mundo; em seres para quem a existência ainda não se transformou numa amarga trivialidade; em infantilidade espiritual, não meramente física.
Contemplemos essa criança diante de um doce e de outra criança. O doce é o seu objeto de desejo. A outra criança é o seu rival. Quando o desejo e a rivalidade ocorrem simultaneamente, ambos tornam-se as sementes de um conflito que pode irremediavelmente destruir relacionamentos ou estilhaçar sonhos. Uma criança normalmente possui a obstinação necessária para enfrentar tal conflito, mas raramente possui a sabedoria necessária para resolvê-lo.
Imaginemos agora um adulto. Estamos nos referindo a um indivíduo que está vivo há muito tempo. Tempo suficiente para transformar a ingenuidade em cinismo, suficiente para converter o entusiasmo em tédio, para remover da existência tudo o que há de especial. Contemplemos esse adulto diante de duas mulheres, incapaz de optar por uma delas. Ambas apresentam virtudes equivalentemente intensas e defeitos igualmente irrelevantes. Um adulto que sustenta experiências de peso considerável sobre seus ombros normalmente exibe uma racionalidade capaz de comparar duas mulheres sob o ponto de vista físico e material, mas raramente exibe os sentimentos capazes de considerar uma delas especial, independentemente da sua aparência ou dos seus bens.
A criança não compreende que poderia simplesmente compartilhar o doce com a outra. O adulto não compreende que deveria valorizar a importância do aspecto emocional. Uma criança tem admirável paixão, mas sofre por não ter conhecimento. Um adulto tem respeitável conhecimento, mas sofre por não ter paixão. Tanto a paixão como o conhecimento não são capazes de resolver todos os problemas sozinhos. Emoções podem criar laços permanentes entre amantes, mas podem dissolver eternamente laços entre rivais. Duas crianças podem compartilhar um doce, mas duas mulheres não podem compartilhar a alma de um homem.
O poeta francês Charles Baudelaire certa vez afirmou que há muito em comum entre aquilo que nós chamamos de inspiração e a alegria espontânea com a qual uma criança consegue absorver as cores e as formas do mundo. Ressaltou, no entanto, que todo o material abstrato acumulado por essa absorção só pode ser adequadamente organizado pelo pensamento racional de um adulto. A genialidade, portanto, nada mais seria do que um redescobrimento da infância. Uma capacidade intrínseca de inebriar-se com o mundo e ao mesmo tempo saber expressá-lo.
O contexto no qual as afirmações de Baudelaire estão localizadas é a arte. Mais especificamente, o poeta refere-se à inspiração e à genialidade de pintores. A área onde esta dissertação de mestrado se encontra é a ciência da computação. O conteúdo deste texto é o resultado do esforço de matemáticos. A pertinência da matemática ao escopo das artes é uma questão filosófica deveras complicada, na qual não pretendemos nos aprofundar. No entanto, ela não precisa ser esclarecida para que possamos adaptar as afirmações de Baudelaire a este trabalho.
Neste mestrado, estudamos conjuntos gerados por combinações inteiras não-negativas de vetores. Apesar de sua razoável extensão, a expressão combinação inteira não-negativa nada mais é do que um sinônimo excessivamente sofisticado de soma. Uma combinação inteira não envolve frações. Uma combinação não-negativa não envolve subtrações. Estudar combinações que são ao mesmo tempo inteiras e não-negativas significa, sob certos aspectos, revisitar a época em que não conhecíamos nenhum conceito matemático além da soma. Redescobrir a época em que éramos simples crianças, incapazes de aplicar o conceito de divisão sobre um doce. No entanto, ao rever um cenário que esteve presente em nossa infância, não é necessário que o contemplemos apenas com olhos juvenis. Podemos combinar a curiosidade infantil com a maturidade matemática.
Um equilíbrio adequado entre esses dois elementos é necessário para o estudo de problemas de otimização combinatória. Nesses problemas, o objetivo é otimizar uma função em um conjunto discreto e normalmente finito. Uma primeira impressão a respeito dessa descrição é a de que ela descreve problemas simples. Mais simples do que uma otimização em conjuntos contínuos, pois de certa forma estes são maiores e mais complexos. Trata-se, no entanto, de uma impressão equivocada. Conjuntos discretos não são simplesmente menores, eles são mais restritos. Conjuntos contínuos não são simplesmente mais complexos, eles são mais flexíveis.
Os problemas combinatórios são formulados dentro de um mundo discreto, no qual os doces são tão indivisíveis quanto para uma criança. No entanto, aqueles que estudam otimização combinatória não são crianças presas a técnicas discretas. São adultos capazes de utilizar técnicas variadas, sendo muitas delas baseadas em conceitos contínuos. São pesquisadores entusiasmados e ao mesmo tempo estudiosos, que podem reconhecer em sua área uma infância redescoberta na ciência da computação."

domingo, 28 de novembro de 2010

Sobre vitórias e derrotas

Nota de Esclarecimento: esse originalmente era um comentário meu (ou, mais precisamente, uma redação) sobre o post Da busca à perfeição, trazido pra cá por sugestão da própria autora, a genial Daniela Yoko. Não deixe de ler o original!

Outro dia eu estava discutindo com amigos, tentando chegar em alguma conclusão sobre os motivos de a matemática ser um dos maiores terrores de boa parte dos estudantes, quando um deles levantou um ponto interessantíssimo, falando do processo de aprendizado de matemática. Enquanto na física ou na química (pra ficar nos exemplos de exatas, mais próximos) você aprende uma fórmula ou um método de resolução de problemas e o aplica à exaustão em problemas essencialmente parecidos, na matemática a coisa funciona diferentemente: frequentemente poucos exercícios que você demora horas pra resolver são muito mais proveitosos que milhões de exercícios resolvidos de forma simples. Uma vez, numa aula de geometria, um professor me disse que tinha um problema que tentava resolver há anos, sem nenhum sucesso -- um problema que vários de seus colegas já tinham resolvido e cuja resposta outros tantos conheciam. Perguntei por que ele não perguntava a eles a resposta e ele respondeu: "Pra quê? Aprendi mais geometria com esse exercício do que com qualquer livro que já tenha pegado pra estudar."

O aprendizado da matemática, mais do que de outras disciplinas, se pauta no erro: e não porque errando você aprende as "armadilhas" de cada tipo de exercício, mas porque errando, brincando com os exercícios, é que você percebe propriedades e padrões que aumentam o seu conhecimento e o seu entendimento da matemática. Enquanto em física e química a obtenção da resposta é o passo principal da resolução, na matemática a ousadia de tentar abordar o problema de diferentes formas é o cerne do aprendizado -- chegar na resposta só prova que a ideia, plantada várias linhas antes, era correta. Outro grande professor me disse o seguinte: "Nunca abandone um exercício por parecer difícil nem o troque por outro que você seja capaz de resolver mais facilmente: encontrar a resposta de um problema é o passo mais triste da busca -- significa que com aquele você não tem mais nada a aprender."

A conclusão, tardia, foi exatamente a sua: não nos ensinaram a perder. E aí a matemática se transforma num monstro quando, junto com os problemas e os métodos para resolvê-los, não aprendemos que falhar -- e continuar tentando -- é parte inerente da vida.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Eudaimonia diária 2 -- a recompensa (continuação)

"Victor,

Há 1 ano e 8 meses eu deixava a Unesp e voltava pra casa com plena certeza de que o meu sonho acabava de ser jogado no lixo. Eu só não sabia que em 5 meses conheceria pessoas INCRÍVEIS, com uma vontade contagiante de ensinar sem receber nada em troca e que me ajudariam a reconquistá-lo. Acho que você não tem noção do quanto eu aprendi e amadureci com vocês; não foi pouco, pode acreditar.
Na época em que eu desisti da Unesp pensava todos os dias se iria me arrepender. Hoje eu digo que, se fosse necessário, faria tudo de novo pra que vocês pudessem fazer parte da minha vida e porque eu percebi que lá as coisas não aconteceriam do jeito que eu planejei. Há quem diga que o Exato "não é tudo isso" (arrumou briga comigo porque eu defendi com unhas e dentes =) ) mas, como eu já te disse uma vez, acredito no projeto e daqui uns 10 anos quero passar lá e ver aquelas salas lotadas e poder dizer: "Parabéns, vocês fizeram a escolha certa, continuem firmes até o fim." Todos merecem meu respeito e gratidão por esse trabalho tão bonito (chegou a parte em que você vai ficar se sentindo o máximo rsrs)
Obrigada por tudo, Victor. Obrigada por me dar a oportunidade de conhecer essa pessoa tão diferente de tudo o que já vi por aí, (você pode até pensar: "Nossa, ela viajou na maionesse, nem me conhece direito"; mas o pouco que eu conheço já é suficiente pra dizer que te admiro, de verdade) que está sempre disposto a fazer o possível pra melhorar o Exato, a ajudar todos que estão lá, que emana esse carinho, vontade, disposição e desejo em dar aulas. Obrigada por me mostrar, nas conversas sobre coisas que não envolviam vestibular e nas suas atitudes, que você não é igual à maioria das pessoas que cruzam o meu caminho (e isso é tão lindo de ver); é daquelas que quando vão embora deixam uma marquinha, um pedacinho de si pra gente lembrar pra sempre.
Tudo o que você tem feito vai ser recompensado. Espero não perder o contato e, daqui a algum tempo, ver que você se tornou um homem melhor ainda e que conseguiu alcançar o que deseja.
Izabelle"

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Eudaimonia diária 2 -- a recompensa

Quando, no colegial, eu sonhava em me tornar professor, os sonhos eram mantidos por todos os professores que eu próprio tive e que contribuíram, cada um à sua maneira, p'ra mudar minha vida. Duvidava que chegasse a ter uma fração que seja da grandeza de cada um deles, não acreditava que pudesse ser para alguém o que eles chegaram a ser para mim. Continuo não acreditando. Mas o fim de ano e o encerramento de aulas trazem uma atmosfera de nostalgia antecipada e às vezes acaba-se ouvindo, dos alunos, declarações de despedida. E às vezes elas superam tudo o que você esperava ouvir: porque alguém te diz, inesperadamente, que você fez a diferença.

Existem horas na vida em que a gente sente que tomou a decisão certa. Essas horas fazem valer a vida toda.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Trilha Sonora da Vida



E, dos comentários no vídeo:
"Though we are just specks in the realm of eternity, there are things we can leave behind. A legacy. Whether it is music, art, or a family that you raised with the man or woman you love. Life is such a fragile thing but it is more beautiful than anything in the universe. It does not matter what you look like, what you believe, or where you came from, we are humanity. 'There are many worlds but they all share the same sky. One sky, one destiny.' Live each day to the fullest, my friends."
Em tradução livre:
"Apesar de sermos apenas ciscos no reino da eternidade, há coisas que podemos deixar para trás. Um legado. Seja música, arte, ou uma família que você criou com o homem ou mulher que ama. A vida é uma coisa tão frágil mas é mais bonita do que qualquer coisa no universo. Não importa com o que você se pareça, ou no que acredite, ou de onde tenha vindo, somos a humanidade. 'Há muitos mundos mas todos dividem o mesmo ceu. Um ceu, um destino.' Vivam cada dia ao máximo, meus amigos."

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Laços

"Minha maior tristeza é que todo novo amor que eu arrumo vem sempre com algum velho amor tão longo e bonito."

Tati Bernardi

domingo, 17 de outubro de 2010

Genialidade

"Genius is insanity made sane by dilution in the abstract, like a poison converted into a medicine by mixture".
Fernando Pessoa, em Erostratus

De um postal de Portugal (:

domingo, 10 de outubro de 2010

Sobre estereótipos

"The problem with stereotypes is not that they are untrue, but that they are incomplete. They make one story become the only story".
Chimamanda Adichie é uma premiada escritora nigeriana que emigrou para os Estados Unidos da América aos 19 anos de idade para ingressar no ensino superior. Numa série de palestras de uma ONG chamada TED (com o objetivo de disseminar ideias que merecem ser divulgadas), ela rouba a cena pra falar sobre estereótipos, simplismo e sobre o perigo de reduzir as coisas à visão do senso-comum, sem reflexão, limitando-se à superfície das coisas. O vídeo é fantástico, de arrepiar mesmo: ela discursa muito bem e é uma fala envolvente. Ele é legendado em português, então deixo aqui o link pra quem interessar (e espero que interesse a muita gente, porque é do tipo de lição que todo mundo deveria ter na vida): http://bit.ly/bv2maD

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Condenados desde que nascem

"Há que ter em conta que a distância entre os que têm e os que não têm apenas tem paralelismo com a distância entre os que sabem e os que não sabem, e os que não têm são os que não sabem: são condenados desde que nascem."
(José Saramago)
(Porque para que algumas pessoas entendam o sofrimento das outras é necessário comparar com algo que as toque)

domingo, 26 de setembro de 2010

Quase 40 anos de silêncio

"ELE:
Se é pra dizer-te adeus/ pra não te ver jamais/ Eu -- que dos filhos teus fui te querer demais--/ no verso que hoje chora para me fazer capaz da dor que me devora/ quero dizer-te mais/ que além de adeus/ agora eu te prometo em paz levar comigo afora o amor demais.
ELA:
Amado meu sempre será quem me guardou no seu cantar/ quem me levou além dos céus/ além dos seus/ e além do mais/ amado meu/ que além de mim se dá/ não se perdeu nem se perderá"


Esses são versos de uma música de Geraldo Vandré que nunca ganhou notoriedade: Pátria Amada Idolatrada Salve Salve. Na música, feita para ser cantada por um homem e uma mulher, a pátria se confunde com a mulher amada. É uma pequena demonstração de um raro talento poético que se perdeu no tempo: depois de voltar do exílio, em 1973, Geraldo não mais se apresentou ao público e manteve suas composições para si -- planeja, ainda, lançar uma música ("Fabiana") em homenagem às FAB (Forças Aéreas Brasileiras).

Nota-se, infelizmente, a figura de um homem vencido pela desilusão. Mas, entre muitas manifestações de um idealismo sufocado, é visível uma genialidade vívida, sintetizada em máximas, como seus comentários sobre a Lei da Anistia e a Tropicália.

O vídeo é longo, mas vale cada minuto dedicado a assisti-lo. Nem que seja por respeito à importância histórica de Geraldo Vandré. A entrevista pode ser assistida a partir deste link.

PS: destaque para a camiseta da FAB que ele veste e para o fato de a entrevista se dar no Hotel da Aeronáutica. Não bastasse, ele é paciente da ala psiquiátrica do Hospital da Aeronáutica, como muitos outros ex-exilados.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Das incertezas da vida

"O problema não é nem tanto querer se auto-criticar e mudar -- é saber como e para onde. Isso é o que doi tanto, o que é tão difícil. A certeza nunca dura muito tempo. Você pode tentar ser o melhor, o mais ético, o mais amigável, e continua recebendo facadas de amigos como se fosse o pior dos monstros."

De um amigo, numa conversa, inesperadamente. É verdade -- até demais. Mas tampouco é motivo pra deixar-se o aperfeiçoamento de lado. Mesmo que doa. E doi.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

As 7 Maravilhas do Mundo

A group of students were asked to list what they thought were the present "Seven Wonders of the World." Though there were some disagreements, the following received the most votes:

  1. Egypt's Great Pyramids
  2. Taj Mahal
  3. Grand Canyon
  4. Panama Canal
  5. Empire State Building
  6. St. Peter's Basilica
  7. China's Great Wall

While gathering the votes, the teacher noted that one student had not finished her paper yet. So she asked the girl if she was having trouble with her list.

The girl replied, "Yes, a little. I couldn't quite make up my mind because there were so many."

The teacher said, "Well, tell us what you have, and maybe we can help."

The girl hesitated, then read, "I think the 'Seven Wonders of the World' are:"

+ to see + to hear + to touch + to taste + to feel + to laugh + and to love

The room was so quiet you could have heard a pin drop. The things we overlook as simple and ordinary and that we take for granted are truly wondrous!

A gentle reminder - that the most precious things in life cannot be built by hand or bought by man. "Each day comes bearing its own gifts. Untie the ribbons."

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Do segredo dos outros

"Já tentei olhar bem de perto o rosto de uma pessoa — uma bilheteira de cinema. Para saber do segredo de sua vida. Inútil. A outra pessoa é um enigma. E seus olhos são de estátua: cegos."
(Clarice Lispector)

“No soy pesimista, es el mundo el que es pésimo”

"Muita gente me diz que sou pessimista; mas não é verdade, é o mundo que é péssimo. O ser humano limita-se na actualidade a “ter” coisas, mas a humanidade esqueceu-se de “ser”. Este último dá muito trabalho: pensar, duvidar, perguntar-se sobre si mesmo…"
(José Saramago)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Sobre a carne

"A carne é supinamente fraca, e não tanto por sua culpa, pois o espírito, cujo dever, em princípio, seria levantar uma barreira contra todas as tentações, é sempre o primeiro a ceder, a içar a bandeira branca da rendição."
(José Saramago)

domingo, 22 de agosto de 2010

Lições de uma criança

When I was 5 years old, my mom always told me that happiness was the key to life. When I went to school, they asked me what I wanted to be when I grew up. I wrote down "happy". They told me I didn't understand the assignment and I told them they didn't understand life.

Em tradução livre:

Quando eu tinha 5 anos, minha mãe sempre me dizia que a felicidade era o segredo da vida. Quando fui para a escola, me perguntaram o que eu queria ser quando crescesse. Escrevi que queria ser "feliz". Então me disseram que eu não entendi a tarefa e eu disse a eles que não entendiam a vida.

domingo, 15 de agosto de 2010

Reviravolta interna

A gente tem dois jeitos de viver a vida: o primeiro é conter os sentimentos, guardando-os para si e revelando-os em momentos oportunos a pessoas oportunas que saibam recebê-los. É o jeito seguro, sem riscos, com poucas decepções. Mas tem um revés: morre-se um pouquinho a cada instante em que se mata um pedacinho de felicidade que a gente tem dentro da gente, por medo da desilusão. A gente vai ficando frio e o mundo vai ficando insosso.
O segundo é o autêntico: expressa-se quando possível o que se sente, as mais ínfimas alegrias, o mais tenro motivo de um sorriso. Credita-se tudo, não se deixa passar nada, agarra-se com força a cada infinitésimo de emoção autêntica que dá sentido à vida da gente.

O lado ruim do segundo jeito às vezes é pior, bem pior do que o do primeiro: sinceridade demais assusta e tem gente, muita gente, que não sabe lidar com quem fala verdades sinceras, expondo demais a alma sedenta de amor que todo mundo tem mas prefere conter. Gente que se dá assim tem fome de grandeza e só mergulha quando o mar é profundo e isso é terrível pra quem acha que não sabe nadar. Então perde-se alguém. Por ser sincero.

Só esquecem que no mar da alma todo mundo nasce sabendo nadar.

[Chega de sofrer pela indiferença quando o bom mesmo é sentir às últimas consequências]


Nostalgia

Ok, vamos admitir: reencontrar gente de quem se gosta e quem não vemos há muito tempo tem seu lado ruim: fica-se o resto do dia pensando em por que não se pode mais estar sempre junto.

sábado, 14 de agosto de 2010

Sonho

Justificativas

"E há muito nada acontece por aqui, eu sei. Mas é difícil apontar motivos, reverter a situação. Sei que tenho saudades do que fui, do que as pessoas me mostram e fui eu que fiz mas não faço mais. Do que dizia com certeza que era minha marca, do que me distinguia dos outros. Acho que me perdi de mim. Só não sei em que parte do caminho, pra poder voltar e procurar."

Porque o ceticismo nas verdades que te definem é muito, muito difícil de suportar.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Em busca do prazer

"E tanto sofrimento por estar, às vezes sem nem saber, à cata de prazeres. Não sei bem como esperar que eles venham sozinhos. E é tão dramático: basta olhar numa boate à meia luz os outros: a busca do prazer que não vem sozinho e de si mesmo. A busca do prazer me tem sido água ruim: colo a boca e sinto a boca enferrujada, escorrem dois pingos de água morna: é a água seca. Não, antes o sofrimento legítimo que o prazer forçado."
(Clarice Lispector)

O presente

"...Amor será dar de presente um ao outro a própria solidão? Pois é a coisa mais última que se pode dar de si"
(Clarice Lispector)

A experiência maior

"Eu antes tinha querido ser os outros para conhecer o que não era eu. Entendi então que eu já tinha sido os outros e isso era fácil. Minha experiência maior seria ser o âmago dos outros: e o âmago dos outros era eu." (Clarice Lispector)

O erro dos inteligentes

"Mas é que o erro das pessoas inteligentes é tão mais grave: elas têm os argumentos que provam." (Clarice Lispector)

Trechos - Clarice

"Estranhei tudo. E, por me estranhar, vi-me por um instante como sou. Gostei ou não? Simplesmente aceitei. Tomei um táxi que me deixaria em casa, e refleti sem amargura: muita coisa inútil na vida da gente serve como esse táxi: para nos transportar de um ponto útil a outro. E eu nem quis conversar com o chofer."

"A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo. E então eu soube: pertencer é viver. Experimentei-o com a sede de quem está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles d'água de um cantil. E depois a sede volta e é no deserto mesmo que caminho."

Sim

"Eu disse a uma amiga:
-- A vida sempre superexigiu de mim.
Ela disse:
-- Mas lembre-se de que você também superexige da vida.
Sim."
(Clarice Lispector)

domingo, 8 de agosto de 2010

Mas há a vida

"Mas há a vida que é para ser intensamente vivida, há o amor. Há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota. Sem nenhum medo. Não mata."
(Clarice Lispector)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Hey, mainstream media: I am...

Jamie Keiles, 18, é uma adolescente americana que foge dos padrões: se diz interessada em sociologia, periódicos e ciclismo. Cansada das matérias fúteis de revistas "Seventeen" (suspeito que algo como a "Capricho" dos EUA) e duvidando completamente da eficácia das dicas da revista, começou um projeto análogo ao "Super Size Me": decidiu passar um mês seguindo religiosamente as dicas da revista. O projeto foi denominado "The Seventeen Magazine Project" e seus resultados podem ser conferidos aqui.

O resultado foi presumivelmente desastroso. Segundo ela, não havia muito nas atividades recomendadas pela revista; a maioria se resumia a ensinar alguma variação de paquera; as dicas de cabelo levavam um tempo grande demais para serem colocadas em prática e as dicas sobre roupas de banho não resolveram seu problema: ter a cor da pele da mesma cor da areia, "ficando parecida com um biquíni flutuante, na praia".

As conclusões: as revistas olham as adolescentes como um grupo uniforme, com interesses limitados a moda, maquiagem e garotos. Em revolta à visão fútil que a mídia tem de um grupo ao qual ela faz parte (e ao qual não se acha reduzida), terminou um projeto com a criação de outro: "Hey, mainstream media: I am...". A ideia é que pessoas enviem fotos em que apareçam com um recado para a mídia. Para participar, basta enviar a foto para: jamiekeiles@gmail.com e o acervo de fotos enviadas pode ser conferido aqui.

O resultado foi extremamente interessante e as pessoas contribuíram de formas diversas: podem ser encontradas desde mensagens de "repelida por sua ideia de 'normal'. Sério, de que planeta você é?", passando por "Sou bissexual... e não só não tento foder qualquer coisa que se move, como QUASE NUNCA faço sexo... e gosto das coisas bem assim. E, além disso, fico bem sem maquiagem." até uma mãe segurando um cartaz com os dizeres: "mais que uma mãe que 'precisa trabalhar', sou uma que quer fazer isso, e sei que não preciso escolher entre a maternidade e a carreira, pois é possível conciliar ambos!".

Bem interessante MESMO. Vale a pena conferir.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Luta contra o paulistanismo

Excelente artigo, mas só pra quem não teme ouvir verdades:

http://blogdosakamoto.com.br/2010/07/09/9-de-julho-sao-paulo-deveria-lutar-contra-o-paulistanismo

domingo, 27 de junho de 2010

(Falsa) Letargia

"Às vezes eu deito na cama e fico quieta, só esperando morrer. E vem aquela bobeira estranha, como quando eu era criança e, de carro na Salgado Filho, me perguntava "Por que é que eu existo?" e me sentia fora do meu corpo. E como nunca achei resposta pra essa pergunta, só fico pacientemente vendo a vida passar, devagar.
E choro, porque queria viver de verdade e sentir de maneiras diferentes. Então durmo, acordo, penso nas coisas que tenho que fazer e saboto todos os planos: "Ah, não estou me sentindo bem hoje!" - o engraçado é que meu corpo obedece, e sempre tem uma dor ou desconforto, que nem sei mais se são de verdade. Mas fico com muito medo do que vai acontecer por eu só esperar, e então, prometo, amanhã eu tomo jeito.
O tempo voa, barulhento, anunciando que outro dia acontece e eu ainda estou aqui, com dor dentro do meu vazio e eu peço, grito: "Por favor, cuida de mim! Me carrega, me faz viver!" E do outro lado só ouço o eco do meu próprio desespero, porque os outros estão ocupados demais vivendo.
De repente a cama e o quarto são escuros demais, e eu só preciso de alguém pra me abraçar, me acalmar, me ninar. Por que é que eu tive a brilhante idéia de sair de casa mesmo? Tenho medo de ficar mais velha e da minha mãe morrer, porque não sou pequena (muito menos grande) demais pra caber no colo dela. Então eu rezo à noite, só pra me sentir mais perto, pra me sentir um pouquinho mais amada, menos insegura.
Esse pedacinho de gente que sou, preciso de amor demais, abraço demais, e o mundo não está sempre à minha disposição. Acho que de tanto eu esticar e comprimir, das vezes em que eu achei que era auto suficiente e me rebelei, ele se tornou frouxo demais pra mim. E eu choro, imploro, "Vem pra cá, por favor, cuida de mim!" E se alguém me responder, vai ser pra dizer que não, agora não, a vida lá fora é bem mais interessante do que ficar deitado na cama, olhando e tentando não fazer parte do mundo."
Do ótimo: http://inconspicuidade.blogspot.com/

terça-feira, 22 de junho de 2010

Coisas feitas

No fundo, todos temos necessidade de dizer quem somos e que é que estamos fazendo e a necessidade de deixar algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas pode ser uma forma de eternidade.

“Somos sobretudo a memória que temos de nós mesmos”, La Provincia, Las Palmas de Gran Canaria, 20 de Julho de 1997 [Entrevista de Mariano de Santa Ana]

Dos Outros Cadernos de Saramago: http://caderno.josesaramago.org/

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Ensaio sobre o Luto



Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de refexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma.

Revista do Expresso, Portugal (entrevista), 11 de Outubro de 2008


Fica o profundo lamento pela morte de alguém tão grande.

domingo, 6 de junho de 2010

Why am I different from others?



http://www.youtube.com/watch?v=Um9KsrH377A&feature=player_embedded

(Por que por aqui não fazem comerciais assim?

Fantástico.)

sábado, 22 de maio de 2010

Filosofia é uma cousa; a realidade...

A opinião ostensiva do médico era que a doença do Quincas Borba iria saindo devagar. Um dia, o nosso Rubião, acompanhando o médico até à porta da rua, perguntou-lhe qual era o verdadeiro estado do amigo. Ouviu que estava perdido, completamente perdido; mas, que o fosse animando. Para que tornar-lhe a morte mais aflitiva pela certeza?...

- Lá isso, não, atalhou Rubião- para ele, morrer é negócio fácil. Nunca leu um livro que ele escreveu, há anos, não sei que negócio de filosofia...

- Não; mas filosofia é uma cousa, e morrer de verdade é outra; adeus."

[Machado de Assis, Quincas Borba]


Ironias do destino: perder na capital e reencontrar no interior

Enquanto eu procurava pela rede as várias fotos que capturavam "o amor é importante. porra" estampado em diferentes partes de São Paulo, vi aparecer na janelinha de "logados" do orkut uma carinha saudosa e conhecida, de uma amiga com quem eu não falava há alguns anos. Puxei conversa, papo aqui, papo lá, pergunto pra ela: "e aí, como vc tá?" e ganho a resposta surpreendente:
"eu tô fazendo artes visuais na unicamp! ^^
tô morando por lá, em barão geraldo
e você? =D"

E eu... eu também. Mundo pequeno, né?

Surpresas gostosas que a vida dá pra gente (:

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Encontros

Os caminhos por onde os homens circulam só aparentemente são complicados. Procurando bem, sempre se encontram sinais de passos anteriores, analogias, contradições resolvidas ou resolúveis, plataformas onde de repente as linguagens se tornam comuns e universais.

In Viagem a Portugal, José Saramago, Editorial Caminho, 21ª edição, p. 237
(Seleção de Diego Mesa)

quarta-feira, 5 de maio de 2010

para saber se gosta muito de alguém

primeiramente, direcione seu pensamento àquele dia mais triste da sua vida;
lembra de cada detalhe, de cada pensamento, de cada folha que caiu;
lembra das pessoas que vinham te dizer que tudo ia clarear;
e, agora, do fundo da alma: se o alguém estivesse lá, de alguma forma, seria menos duro?

Retirado de: http://recantana.blogspot.com/

domingo, 21 de fevereiro de 2010

O mais difícil

"The hardest part of moving forward

are these times when we all stand alone."

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Imagem vivaz do gênio e do vulgo!

"E partiu a comitiva. Crispim Soares, ao tornar à casa, trazia os olhos entre as duas orelhas da besta ruana em que vinha montado; Simão Bacamarte alongava os seus pelo horizonte adiante, deixando ao cavalo a responsabilidade do regresso. Imagem vivaz do gênio e do vulgo! Um fita o presente, com todas as suas lágrimas e saudades, outro devassa o futuro com todas as suas auroras."

[Machado de Assis, O Alienista]

Em resposta a quaisquer críticas sobre impulsividade

"Por te falar eu te assustarei e te perderei? mas se eu não falar eu me perderei, e por me perder eu te perderia."
A identidade da autora é óbvia.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Assim é, se lhe parece.

"Eu e você usamos a mesma língua, as mesmas palavras. Mas que culpa temos nós de que as palavras, em si, sejam vazias? Vazias, sim. Ao dizê-las a mim, você preenche-as com o seu sentido e valor; e eu, ao recebê-las, inevitavelmente preencho-as com o meu sentido e valor. Pensamos que nos entendemos; de fato, não nos entendemos. "

Pirandello

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Nasce um herói

And they say
That a hero could save us
I'm not gonna stand here and wait