terça-feira, 21 de junho de 2011

Neo-idealismo

(Ou, alternativamente, "De um idealismo sonhador a um idealismo pragmático")

Toda ideologia passa por mudanças.

Nasce de experiências, vai sendo lapidada por valores e sonhos, e, incubada, vai vagarosamente ganhando espaço. A partir daí, toda evolução e transformação ideológica dá-se por um processo dialético hegeliano -- algo como a noção de tese-antítese-síntese popularizada por Kant, mas mais claramente compreendido se tomarmos o conceito como concebido originalmente por Hegel: o Abstrato (a ideologia pura), sucedido pela Negação (o contato com a realidade) e sintetizando o Concreto (o substrato resultante). Dá-se, simples e necessariamente, porque toda ideologia se transforma. Ideologia imutável é ideologia nunca posta em prática.

Todo idealista sofre de um mal crônico: ingenuidade excessiva. Quer sempre acreditar que é possível, quer sempre acreditar nas pessoas, quer sempre que tudo seja perfeito. E não só quer, mas se esforça verdadeiramente para que as coisas aconteçam desse jeito (não, quem só acredita que tudo pode ser melhor não é idealista: é simplesmente otimista. O idealismo pressupõe ação). Mas, como nada é bom se não for ótimo, é comum ver oportunidades esvaindo-se sem que sejam aproveitadas. Pra tudo é necessário um ritual, tudo o que tem alguma importância é meticulosamente planejado e revisitado em pensamento incontáveis vezes antes de ser posto em prática. E, frequentemente, se há algum indício de que o plano não atingirá o grau de perfeição imaginado, adia-se sua realização, como se nenhuma falha fosse tolerável. O pecado do idealista é o cerimonialismo.

Então perde-se muito na vida até que se aprenda a deixar esse vício pra trás. Até que se perceba que oportunidades não esperam por situações ideais para aparecerem. Até que se perceba que, se não aproveitadas do jeito em que batem na sua porta, por mais maltrapilha que seja sua situação, vão procurar outro que melhor as use. Até que se perceba que o que torna um momento especial não é o quanto ele foi planejado ou quanto fidedigno ao roteiro ele provou ser, mas a sinceridade dos sentimentos envolvidos e as pessoas que participaram dele.

("Mas você mesmo é um grande fugitivo.", eu ouvi hoje. Devo ser mesmo.)

3 comentários:

  1. "Oportunidades não esperam por situações ideais para aparecerem. Se não aproveitadas do jeito em que batem na sua porta, por mais maltrapilha que seja sua situação, vão procurar outro que melhor as use." - Não há maior momento de sabedoria do que este. Mas como alguém que enxerga e consegue botar isso em palavras ainda continua a fugir meu Deus do céu? Olha que bem disse que essas oportunidades maltrapilhas vão é bater na porta de outro ham? Você se avisou. Escute-se ;)

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  2. Elas às vezes se disfarçam. Nem sempre se mostram como oportunidades quando aparecem...

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  3. Acho que ninguém é fugitivo sempre. Escolhemos as situações de fuga: esses eventos não tão bem orquestrados aparentemente, mas, muito antes da realidade idealizada ingenuamente, é a própria realidade pensada em manifesto. Concebemos os erros e fazemos a tal avaliação seletiva. E o que sobra dessa seleção não é o nada. Bem disse a Dani... "Você se avisou. Escute-se"; então, deixe-se em alguns momentos de entrega, de dar oportunidades e receber as escolhidas ou, nessas vezes de disfarce, deixar-se indo e fugindo. Como você mesmo disse no outro post, o consolo maior seria "tudo bem, não deu certo, mas pode dar na próxima" e, não sei bem, mas pode dar mesmo. =)

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